CARNAVAL


"Como filhos obedientes, não vos conformeis com os antigos desejos do tempo da vossa ignorância; mas, assim como é santo aquele que vos chamou, sede santos, vós também, em todo o vosso proceder, conforme diz a Escritura: Sede santos, porque Eu sou santo."
I Pedro 1, 14-16

Estamos as vésperas do Carnaval e recorri, então, ao Livro do Eclesiástico para procurar sentido para esses dias que antecedem o tempo penitencial da quaresma.
Não os posso entender como dias em que se joga fora a dignidade pessoal e se permite o rebaixamento da pessoa. Lembro-me que o “Eros” desregrado conduz ao “pornô” e tem a sua oposto no ”tanatos”. Se nos dias normais, vemos tantas desgraças conseqüentes a depravação dos costumes, o noticiário dos dias de carnaval em geral é desolador.
A arte que transparece nas danças e desfiles, o trabalho dos artesãos que os precede fica obscurecido pelo “pornô” e “tanatos” que imperam nesses três dias. Cansados, artistas e o público, silenciam-se após os desfiles. Não são conduzidos a contemplação do belo que eleva a alma. Tóxicos e bebedeiras lançam nas sargetas corpos jovens, perdido o sentido da vida.
No entanto, o que nos ensina o Livro sapiencial:
“Não te deixes dominar pela tristeza e nem te aflijas com teus pensamentos.
A alegria do coração e a vida do homem, a alegria do homem aumenta os seus dias.
Ilude tuas inquietações, consola teu coração, afasta para longe a tristeza, porque a tristeza matou a muitos e nela não há utilidade alguma.”
(Cf. Eclo. 30,21-25)
Temos, já no Antigo Testamento um convite a alegria e a efusão dos sentimentos. Os judeus celebram o Ano Novo recordando o riso e a alegria de Sara e Abraão com a realização da promessa em Isaac. O Novo Testamento é todo ele o anúncio da alegria, a Boa Nova da salvação, que leva São Paulo a concitar-nos a alegria, “iterum dico”, digo de novo, repito, alegrai-vos. (Cf. Fil.4,4).
Antes de um tempo em que a Igreja convida seus filhos a uma reflexão mais intensa sobre sua presença no mundo como cidadãos do Reino e sobre o empenho que devem ter pela sua santificação, santificando todas as coisas, a Igreja também nos impulsiona à alegria, dom misericordioso de Deus, que nos faz prelibar as delicias eternas.
Sem se conformar com o mundo, o cristão tem de ser um homem e uma mulher alegre. E motivos os temos, e muitos, desde o dom da vida, da liberdade, de podermos gozar dos nossos sentidos integrados com a consciência de que caminhamos para a perfeição. “Um santo triste é um triste santo”, dizia São Francisco de Sales.
O canto, a dança, a arte, os folguedos fazem parte de nossa condição humana. Como atos neutros, podem se desviar do seu fim e é neste sentido que o Carnaval destrói a dignidade. Pelo contrário, se os praticarmos como expressão da nossa corporeidade e sentimentos dirigidos para a realização segundo a natureza em fomos criados e na consciência de redimidos, representa um crescimento pessoal e um esforço para ajuda aos irmãos, livrando-os das tristezas e penas de cada dia.
Procuremos nos alegrar, descansar dos labores pesados do dia-a-dia, nesse Carnaval. Que eles nos ajudem a preparar todo o rito penitencial da quaresma, já vivendo estes dias na alegria do Espírito Santo.


Dom Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora (MG)
Fonte: CNBB

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